segunda-feira, julho 17, 2006

Salários de CEOs

Publicado no Diário Económico a 30/5/2006
A luta pelo controlo do BPI tem sido recheada de episódios. Um dos pontos de discussão é o salário dos gerentes do BPI e do BCP. Enquanto o conselho de administração do BPI é bem pago, os seus colegas do BCP ganham muitas vezes mais. Tendo em conta que os dois bancos são em muito semelhantes, esta diferença não deixa de ser curiosa.
Será que os gestores do BCP são pagos demais? De certa forma, a resposta tem de ser não. O BCP é uma empresa privada, com accionistas interessados em obter um retorno no seu investimento. Quanto mais pagarem ao CEO, menores os lucros que recebem. Se os accionistas, de livre vontade, decidiram pagar muito a Paulo Teixeira Pinto e companhia, por alguma razão o decidiram fazer. Se estão a pagar demais, então o dano é deles.
Uma pergunta mais interessante é se os gestores são compensados de uma forma eficiente. Numa grande empresa, com milhares de accionistas com opiniões e interesses diferentes, não é fácil decidir como recompensar adequadamente o CEO. Para além disso, o seu contrato tem de criar os incentivos correctos para que ele ou ela se esforce em gerar lucros para os accionistas. Uma componente importante de um esquema de compensação eficiente é que o salário do CEO aumente com os lucros da empresa. Desta forma, os seus objectivos e os dos accionistas coincidem.
No entanto, este princípio só se aplica à componente do lucro que depende do trabalho do CEO. Se uma parte do lucro depende de factores que o CEO não pode afectar (chamemos-lhes sorte), então não há razão para compensar o gestor por isso. Antes pelo contrário, se ele for avesso ao risco, a empresa pode-lhe pagar menos em média se lhe oferecer um salário que não depende da sorte.
Os economistas Marianne Bertrand e Sendhil Mullainathan decidiram testar esta hipótese. Usando dados sobre a compensação de vários executivos de grandes empresas americanas, eles mediram se esta varia com a parte da ‘performance’ que se deve à sorte. No seu primeiro estudo, eles olharam para a indústria petrolífera. Uma parte importante dos lucros desta indústria depende das flutuações do barril de petróleo no mercado internacional. Muitas destas flutuações devem-se a factores para além do controlo dos CEO: decisões políticas da OPEC, distúrbios militares no Médio Oriente, etc. No entanto, os economistas descobriram que a compensação dos gestores variava tanto com os rendimentos gerados pelas flutuações do preço do petróleo, como com os rendimentos de outras fontes.
De seguida, Bertrand e Mullainathan olharam para o conjunto alargado de empresas que exportam parte da sua produção. Para cada sector, eles construíram a taxa de câmbio efectiva que pesa as variações nas diferenças taxas de câmbio em relação ao dólar pelo tamanho de cada país nas exportações do sector. As flutuações nestas taxas de câmbio estão, na grande maioria dos casos, fora do controlo do CEO. No entanto, o salário dos CEO de 192 companhias entre 1984 e 1991 em média aumentou quando a taxa de câmbio mudou em favor da empresa.
No seu terceiro teste, Bertrand e Mullainathan compararam a ‘performance’ de cada empresa com a ‘performance’ do sector em que se inserem. Nos sectores com muitas empresas, a ‘performance’ de um CEO tem pouco ou nenhum efeito sobre a ‘performance’ do sector. No entanto, os economistas descobriram que os CEO eram recompensados pelos bons tempos no sector.
Bertrand e Mullainathan fornecem uma pista importante para perceber o que está por detrás desta ineficiência. Quando eles separaram as empresas entre as que têm alguns grandes accionistas e as que não têm, descobriram que só nas últimas é que a ‘performance’ do CEO depende da sorte. Quando introduziram como variável no estudo os anos que o CEO já leva ao comando da empresa, descobriram que só nas empresas com CEO mais antigos é que a compensação é ineficiente.
Estes resultados indicam que nas empresas em que há melhor ‘corporate governance’, a compensação dos CEO é próxima da eficiente. Mas o CEO é recompensado quando tem sorte nas empresas que não têm alguns grandes accionistas que invistam o tempo e recursos a garantir que a empresa é bem gerida e nas quais o CEO está entrincheirado há anos no cargo. Para além de se pagam muito ou pouco, os accionistas do BCP, do BPI, e de outras grandes companhias, devem-se preocupar em pagar pelas razões certas.

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