domingo, dezembro 09, 2007

Ganhar dinheiro

Publicado no Diário Económico a 3/7/2007.

Algumas pessoas ganham muito dinheiro. Nesta coluna, vou-lhe explicar o que fazem. Provavelmente, está desconfiado. Afinal de contas, os académicos são conhecidos por preferirem ideias abstractas e não por saberem gerar lucros.

Mas, nem sempre é assim. Nos EUA, há um fluxo crescente de doutorados em economia, matemática e computação no sentido das empresas de investimento. Um dos percursores deste movimento foi Jim Simmons, um antigo professor conhecido pela teoria Chern-Simmons, que tem algumas aplicações na física quântica. Em 1982, fundou uma firma de investimentos e rodeou-se de ex-professores e doutorados. A empresa gere o famoso fundo Medallion, que desde a sua fundação em 1988, teve um retorno anual de 34%. Em 2006, Simmons ganhou cerca de $1,7 mil milhões de dólares.

Muitos destes académicos ganham dinheiro explorando a ideia mais básica da economia financeira: a arbitragem. Para perceber como funciona, imagine que você pode comprar acções do BCP na bolsa americana ou na bolsa portuguesa. Se as acções são exactamente as mesmas, você vai receber o mesmo por elas daqui a um mês, aconteça o que acontecer. Imagine no entanto que o preço é maior na bolsa portuguesa do que na americana. Então, se você der uma ordem de compra na bolsa americana e uma ordem de venda na bolsa portuguesa, ganha dinheiro sem nenhum risco. Chama-se a isto uma oportunidade de arbitragem. Claro que, como todos o percebem, todos vão tentar vender as acções portuguesas e comprar as americanas, levando os preços a ajustar-se até serem o mesmo nos dois mercados.

Existem poucos produtos financeiros exactamente iguais, como neste exemplo. Mas, existem tantos instrumentos financeiros hoje em dia, que se podem construir várias carteiras que combinam acções, obrigações, e opções de forma a replicarem exactamente outros produtos existentes. Não faltam investidores que fazem este trabalho de construção de “carteiras-cópia”. Os mercados financeiros hoje em dia são extremamente eficientes, pelo que não demora mais do que dois ou três minutos até que chovam ordens de compra e venda que eliminam as oportunidades de arbitragem. É preciso ser um dos primeiros a agir para, após as comissões de corretagem, ganhar apenas uns 0,01%.

É aqui que entra a fórmula de fazer dinheiro dos fundos que usam académicos. Começam por contratar economistas com criatividade e inteligência para construir modelos que criam novas “carteiras-cópia”. Para implementar os modelos abstractos com os números dos mercados é preciso resolver numericamente algumas equações, que têm um nome que pode meter medo (equações parciais diferenciais), mas são conceptualmente simples. Existem programas de computador que qualquer licenciado numa ciência quantitativa sabe usar para resolver estas equações em poucas horas.

É aqui que entra o segundo grupo de académicos. As equações em questão são do mesmo tipo que outras que surgem no estudo da electricidade, calor e som. Contratam-se então físicos e matemáticos aplicados que se dedicam a criar programas mais sofisticados que resolvem as ditas equações em alguns segundos ou minutos em vez de horas.

Por fim, contratam-se especialistas em computadores e telecomunicações. Estes tratam de transmitir o mais depressa possível as ordens de compra e venda às plataformas electrónicas dos mercados.

Com este grupo de académicos em lugar, o fundo garante que vai ser quase sempre o primeiro a detectar e agir sobre uma oportunidade de arbitragem. O fundo ganha sempre os tais 0,01%. Parece pouco, mas imagine que os académicos conseguem detectar uma dúzia destas oportunidades por dia. Ao fim de um ano (250 dias de mercados abertos), o fundo ganhou 28%.

Chegado ao fim da coluna, provavelmente já percebeu que não vai aprender a ganhar dinheiro. Mas, se voltar ao início, repare que não prometi isso, mas apenas explicar-lhe como é que algumas pessoas ganham dinheiro. Eu posso ser académico, mas também sou economista: se eu souber formas fáceis de ganhar dinheiro, vou eu ganhá-lo, em vez de escrever sobre isso.

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