segunda-feira, julho 17, 2006

Desafios para o novo presidente

Publicado no Diário Económico a 23/1/2006

Em Portugal, o Presidente da República tem vários deveres: ser moderador, fazer respeitar a Constituição e promulgar novas leis, garantir a estabilidade e independência da nação, liderar o Estado, proteger a igualdade entre os cidadãos, e representar o país no estrangeiro. No cumprimento destes deveres, o novo Presidente vai ter de enfrentar grandes desafios.

1. A crise na Segurança Social. O sistema de Segurança Social em Portugal, assim como em quase todos os países da OCDE, está em crise. Porque as pessoas vivem mais anos e têm menos filhos, o sistema tem cada vez menos trabalhadores que pagam e mais reformados que recebem. Dependendo do crescimento da produtividade, a Segurança Social vai entrar em défice algures durante o (previsível) segundo mandato do novo Presidente.

Não cabe ao Presidente reformar a Segurança Social, nem sequer sugerir o melhor caminho a seguir. Mas cabem-lhe dois papéis importantes: alertar e moderar. Alertar para o problema, que é hoje um dos maiores temas de debate noutros países ocidentais. Moderar, porque todas as soluções envolvem prejudicar algumas gerações em benefício de outras. Escolher entre pais e filhos é muito difícil numa democracia.

2. A reforma na Administração Pública. Por um lado, os serviços da Administração Pública não são eficientes e os seus funcionários gozam de direitos inaceitáveis. Por outro lado, estes funcionários que na sua maioria são competentes e trabalhadores estão subaproveitados e mal geridos. Faltam-lhes objectivos concretos e recompensas pelo seu esforço.
O novo Presidente tem de exigir que se cumpra a Constituição – a Administração Pública tem de servir os cidadãos. Incentivar o Governo neste sentido, por exemplo promulgando leis que restabeleçam bons incentivos para os funcionários, era uma ajuda preciosa para recuperar a confiança perdida no sector público.
3. A consolidação orçamental. O Governo, quando foi eleito, declarou como objectivo principal equilibrar as contas do Estado. Está em causa a estabilidade da nação que não pode viver constantemente sujeita a aumentos de impostos e incumprimento dos compromissos do Estado. Está também em causa a independência nacional, se se concretizarem as sanções da União Europeia.
Quando os esforços de consolidação afectam os direitos de alguns, cabe ao Presidente apoiar o Governo nesta missão. Quando o Governo se deixe tentar por outros projectos, “desígnios nacionais”, ou “paixões”, cabe ao Presidente recordar-lhe os seus deveres.

4. A Justiça. O sector da Justiça é hoje, em Portugal, o maior obstáculo ao desenvolvimento económico. A economia de mercado requer pouca intervenção estatal, mas exige que os direitos de propriedade sejam respeitados. Em Portugal, os credores não conseguem cobrar dívidas, os trabalhadores não conseguem fazer cumprir contratos, os empreendedores não conseguem adaptar as empresas ao mercado, e os inovadores não conseguem proteger as suas ideias.
Para funcionar bem, o mercado precisa de um sistema de justiça eficaz, justo e rápido. Reformar a Justiça requer uma delicada coordenação entre órgãos de soberania independentes. O Presidente tem de liderar os diferentes poderes neste desafio.
5. As mulheres e os imigrantes. Em Portugal, as mulheres entraram com rapidez no mercado de trabalho e alcançaram, nalgumas ocupações, a paridade com os homens. Mas, por alguma razão, continuam ausentes da liderança das grandes empresas ou da chefia do Estado. Portugal tem acolhido centenas de milhares de imigrantes sem grandes distúrbios sociais. Mas, por alguma razão, não vemos discursos políticos dirigidos a estas pessoas nem a sua ascensão a lugares de prestígio. Porquê?

Cabe ao Presidente liderar a busca de respostas. Nestes dois grupos estão os recursos por explorar que vão garantir o futuro de Portugal. A melhor imagem que o Presidente pode transmitir para o estrangeiro é que está disposto a liderar Portugal na resposta a estes desafios. Nada melhor para inspirar credibilidade e confiança no país.

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