segunda-feira, julho 17, 2006

Pró-globalização

Publicado no Diário Económico a 22/12/2005

Na última semana, decorreu mais uma ronda de negociações para a liberalização do comércio internacional. Como vai sendo hábito, o encontro em Hong Kong foi marcado por manifestações violentas.
Tenho muita dificuldade em perceber manifestações anti-globalização. A globalização é a transformação mais profunda e benéfica que eu presenciei. Há 20 anos, atravessar a fronteira com os meus pais para ir a Espanha era uma pequena aventura. Hoje é rotina. Ir a um restaurante japonês ou mexicano era exótico e inacessível. Chinês ou indiano só em Lisboa ou no Porto. Na altura, era uma excitação receber um chocolate suíço de quem vinha do estrangeiro; hoje, tenho à minha escolha dezenas na mercearia da esquina. Outro dia assisti num aeroporto a um diálogo entre um emigrante que explicava a outro que agora viajava para Portugal com pouca bagagem porque já não precisava de levar os produtos americanos de que gostava. Dizia-lhe: “Hoje em dia, encontra lá tudo. Até o arroz Uncle Ben’s!”
No outro sentido, eu moro numa pequena vila nos Estados Unidos, com poucos emigrantes portugueses em redor. No entanto, como queijo de Azeitão e doce de tomate, durmo em lençóis de algodão portugueses e dou de prenda garrafas de cristal Atlantis, tudo isto comprado nas lojas das redondezas.
Não é só nos produtos que vemos a globalização. Esta coluna começou a ser escrita num voo sobre o Atlântico vindo de Nova York, prosseguiu em Tel Aviv, e foi completada em Frankfurt, antes de a entregar em Lisboa. Em todos os pontos desta viagem, apenas precisei de apresentar o meu passaporte sem qualquer visto. Turistas de todo o mundo visitam Portugal e a emigração já não é uma escolha de vida para sempre, mas frequentemente apenas um episódio transitório.
Graças à globalização, hoje posso investir as minhas poupanças nos países emergentes da Ásia dando-lhes o capital de que necessitam em troca da possibilidade de partilhar o seu sucesso económico. Posso também pôr o meu dinheiro ao serviço de um fundo social que só invista em projectos no Brasil que respeitem o ambiente. Ou posso castigar as empresas portuguesas que apresentem contas pouco transparentes comprando antes acções na bolsa americana.
Porque é então que pessoas de diferentes países que comunicam pela Internet, partilham referências culturais, usam os seus cartões de crédito para viajar, e adoram diversidade étnica na comida, se decidem encontrar em Hong Kong para protestar contra a globalização? Alguns deles são simplesmente desordeiros à procura de um pretexto para desacatos, em nada diferentes dos ‘hooligans’. Outros são idealistas que, ou anseiam por um retorno a uma visão artificial do passado sem indústrias mas também sem a mortalidade infantil ou a baixa esperança de vida, ou sonham com um futuro risonho onde tudo é permitido mas nenhumas escolhas ou sacrifícios são exigidos.
Mais ameaçadores contudo são os manifestantes que têm por detrás grupos de interesse. Em todos os países, em qualquer momento, existem habitantes com uma posição estabelecida na sociedade e no mercado. Neste grupo incluem-se os capitalistas que controlam as empresas, os políticos e burocratas no topo do aparelho de Estado, ou mesmo os agricultores que fornecem os alimentos. A sua posição está permanentemente ameaçada, por novas empresas que melhor satisfaçam as pessoas, por invenções que tornem as suas competências obsoletas, ou por outros que façam melhor e mais barato. A globalização é a maior ameaça porque multiplica as fontes de concorrência. Numa sociedade de mercado que funcione bem, a resposta destes grupos instalados seria esforçarem-se, trabalharem e inovarem, antes que os outros o façam. Uma opção frequentemente mais fácil é capturar o poder político e usá-lo para proteger os seus interesses. A exploração do nacionalismo e do medo do que vem de fora são algumas das armas poderosas que usam. É na capacidade de combater estes grupos que se joga todos os dias o futuro de uma sociedade próspera, livre, e global.

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