domingo, dezembro 09, 2007

Balanço aos 50

Publicado no Diário Económico a 14/8/2007.

Esta é a coluna número 50 que escrevo para o DE. Olhando para o que escrevi, quatro temas surgem com mais frequência. Segue um balanço do que aprendi e tentei transmitir.

1. A desigualdade. Entre 1970 e 2000, o número de pobres no mundo caiu a um ritmo impressionante: de 534 para 322 milhões. Na China, na Índia e na Indonésia mora quase metade da população humana e estes países têm crescido espectacularmente. Parte deste progresso milagroso deve-se à profundamente benéfica recente intensificação da globalização.
Não é a desigualdade que causa preocupação, mas a estagnação em África. No continente africano morrem milhões com doenças infecciosas que recebem pouca atenção na investigação farmacêutica. A culpa é em parte dos governos, que expropriam quaisquer inovações eliminando o incentivo para investir em pesquisa, mas também de uma falha de mercado, pois os africanos não têm hoje dinheiro para pagar pelos remédios que lhes permitiriam criar riqueza no futuro. Há por isso lugar para ajuda internacional que incentive descobertas científicas.

2. A segurança social. Em quase todos os países desenvolvidos, a segurança social está em crise devido a um facto inescapável: com o envelhecimento da população, existem menos pessoas a trabalhar e mais pessoas a receber. O problema afecta também os fundos de pensões de grandes empresas, algumas das quais valem hoje zero por causa das obrigações assumidas com as reformas.

Não se resolve o problema actual com engenharias financeiras, nem mesmo com reformas radicais como a privatização ou as contas individuais. É inevitável que alguns percam direitos adquiridos, e a questão profunda e difícil é como distribuir os custos entre diferentes gerações.

3. Finanças públicas. O controlo do défice público tem causado dores de cabeça, mas é importante não perder a motivação, por exemplo lembrando o caso da Irlanda. Após resolver em 1987 um problema de finanças públicas semelhante ao português, a Irlanda entrou numa fase de crescimento e é hoje um dos países mais ricos da Europa.
Parte da pressão sobre as finanças públicas vem da Comissão Europeia, preocupada com a credibilidade do Euro e do BCE. No entanto, é preciso ter em conta que há algumas provas de que a Comissão tem sido demasiado dura nas suas previsões para as finanças públicas portuguesas.

Mais a longo prazo, a teoria económica sugere algumas reformas fiscais radicais. Uma taxa fixa para o IRS, que elimina todos os escalões e deduções, é exequível, diminuiria a fraude por aumentar a transparência, e aumentaria a eficiência e riqueza no país. Uma taxa maior para os homens do que para as mulheres, traria ganhos mais modestos mas também significativos.

4. Trabalho e desemprego. O desemprego subiu desde 2000. O que causa especial preocupação é a tendência histórica do desemprego para subir rapidamente, mas demorar muitos anos a descer. Explicar o desemprego ou eliminá-lo não é fácil, mas podemos excluir más ideias. Por exemplo, o influxo de imigrantes parece não levar a desemprego, e estima-se que o impacto da subida no salário mínimo é muito pequeno. Também deveria ser claro que ‘esquemas’ como criar empregos inúteis no Estado não resolvem nada.

O grande facto do mercado de trabalho do século XX não são as flutuações do desemprego, mas antes a entrada em massa das mulheres. Por detrás desta mudança esteve em grande parte a pílula contraceptiva, que permitiu que as mulheres pudessem investir em carreiras.

Por outro lado, um dos maiores puzzles actuais no mercado de trabalho é a ausência relativa de mulheres em cargos de topo. Há muitas explicações, algumas mais provocadoras. Por exemplo, existem provas de que quando aumenta a concorrência num sector, deixa de haver lugar para discriminar, e as mulheres sobem a cargos de chefia. Também existem sinais de que as mulheres se inibem de competir na presença de homens, sugerindo um papel para as escolas unisexo.
A minha experiência ao escrever colunas quinzenais para o DE ensinou-me que são estes os temas económicos centrais a debater em Portugal.

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