domingo, dezembro 09, 2007

Escolher a escola

Publicado no Diário Económico a 20/11/2007.

Há uma opinião que todas as pessoas que conheci em todos os países partilham: o seu sistema de ensino é o pior do mundo. Uma reforma que tem cada vez mais apoiantes em todo o lado consiste em dar aos pais a liberdade de escolher a escola dos seus filhos. O argumento a favor nota que as escolas que atraem mais alunos serão recompensadas com mais fundos (privados ou públicos). Obrigadas a competir, as escolas terão de se esforçar e fazer melhor.

Para mim, este argumento é muito sedutor. No entanto, como discuti na última coluna, ele não é necessariamente válido. Por exemplo, talvez os pais não sejam capazes de distinguir as boas escolas. Nesse caso, a competição entre escolas não terá nenhum efeito. Ou, ainda pior, talvez um sistema com liberdade de escolha leve a uma segregação extrema dos alunos, condenando os maus alunos a terem maus colegas sem hipóteses de melhorar.

Resolver esta questão com dados não é fácil. Existem pelo menos dois grandes desafios. Primeiro, até hoje existem poucos casos em que se tentou um sistema com livre escolha a grande escala. Por isso, não temos observações para avaliar os seus efeitos. Segundo, mesmo que houvesse uma correlação positiva entre a liberdade de escolha e os resultados escolares, isto não implicaria que a primeira causa os segundos.

Num dos artigos mais famosos em economia na última década, Caroline Hoxby apresentou uma solução para estes problemas. Ela notou (seguindo um argumento de Charles Tiebout) que os pais nos EUA (ou em Portugal) podem escolher onde morar, e assim escolher a escola pública dos seus filhos. Claro que esta escolha tem custos, por exemplo em mudar de casa e em viver numa zona de que gostam menos. Mas podemos medir estes custos, e usar o número de escolas numa área metropolitana como uma medida da disponibilidade de escolha (custosa) para os pais dentro dessa área.

Segundo, Hoxby notou que, no passado, era mais difícil viajar em zonas com mais obstáculos naturais. Por isso, nestas zonas criaram-se mais escolas para cobrir as diferentes regiões. Hoxby usa o número de rios em cada zona metropolitana como medida de obstáculos naturais e mostra que, de facto, zonas com mais rios têm ainda hoje mais escolas. Resolve por isso o segundo problema, pois pode usar a variação entre cidades no número de rios para medir o efeito causal que um aumento no número de escolas tem na performance escolar.

Olhando para os dados desta forma, a resposta é clara: maior liberdade de escolha aumenta significativamente as notas dos alunos e reduz os gastos públicos. Claramente, aumenta a produtividade.

Infelizmente nos últimos anos, os economistas têm sido obrigados a reapreciar os méritos da liberdade de escolha escolar. Em primeiro lugar, o estudo de Hoxby tem estado envolvido em controvérsia. Num escândalo que tem dado muito que falar, tem-se vindo a descobrir que os resultados de Hoxby são mais frágeis e menos claros do que ela descreveu.

Em segundo lugar, Jesse Rothstein fez uma pergunta diferente com dados semelhantes. Ele repara que é de esperar que melhores alunos tenham melhores notas, independentemente da escola. A escola será melhor, ou mais produtiva, se conseguir tornar esta relação mais forte. Mas nos dados, Rothstein mostra que aumentar a liberdade de escolha não o faz.

Em terceiro lugar, Chang-Tai Hsieh e Miguel Urquiola descobriram melhores dados para avaliar a liberdade de escolha. No Chile, em 1981, o estado deu cheques-ensino a cada aluno, que podiam ser usados para pagar qualquer escola privada a sua escolha. Usando a variação entre diferentes municípios na disponibilidade de escolas privadas em 1981, os economistas descobriram que a liberdade de escolha não tem qualquer efeito nas notas de exame, nas taxas de reprovação, ou nos anos de escolaridade.

Por muito que me seduza o argumento a favor da liberdade de escolha escolar, os dados levam-me a concluir que não é claro que traga os benefícios prometidos. Nesta área tão importante, os investigadores ainda não conseguiram dar as respostas seguras de que a sociedade precisa.

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