domingo, dezembro 09, 2007

O puzzle das prostitutas

Publicado no Diário Económico a 25/9/2007.

Porque são algumas profissões melhor compensadas do que outras? Muitas pessoas dirão que depende do valor intrínseco da tarefa, ou das virtudes dos seus executantes. Quem aprendeu economia responde antes que a compensação é maior porque a oferta de trabalho é mais restrita em relação à procura. Perceber as diferenças de rendimentos passa então por entender o que determina oferta e procura.

Tomemos por exemplo os médicos. Quem explica rendimentos apelando à moralidade ou ao valor diria que a medicina tem altos salários porque é uma ocupação nobre que salva vidas e porque os médicos tendem a ser pessoas inteligentes e trabalhadoras. O problema com estas explicações é que elas são rapidamente falsificadas. Os canalizadores ou os lixeiros são tão ou mais valiosos e eficazes do que os médicos a prevenir doenças, mas ganham pouco. Os arqueólogos especializados na baixa Mesopotâmia são pessoas extraordinárias, mas têm salários modestos.

Um economista notaria antes que são precisos muitos anos de treino para adquirir as qualificações necessárias para exercer medicina. Porque poucos têm a capacidade intelectual ou financeira para as obter, há uma oferta reduzida de médicos. Quanto à recolha do lixo, existem milhões de pessoas que, com umas semanas de treino, seriam capazes de o fazer. Se o salário dos homens do lixo subisse muito, estas pessoas certamente o fariam. Tão importante quanto a oferta actual é a oferta potencial.

Voltando aos médicos, uma profissão pode manter o seu salário alto se conseguir limitar a oferta potencial. A ordem dos médicos há décadas que impede cursos e estágios em medicina, cortando pela raiz as ambições de milhares de jovens que poderiam aumentar a oferta no futuro.

Por fim, os arqueólogos ganham pouco, embora tenham anos de formação e possam impedir a entrada no seu campo. No seu caso, a procura ainda é menor do que a oferta.

Há uma comparação entre profissões mais difícil: mulheres de limpeza ‘versus’ prostitutas. De acordo com vários inquéritos, as segundas recebem muito mais do que as primeiras, mas é difícil argumentar que as prostitutas têm mais mérito ou valor. As explicações económicas acima também têm dificuldade: ambas as profissões exigem poucas qualificações, têm uma oferta potencial abundante, e é fácil anunciar e vender estes serviços. O que explica este ‘puzzle’ do alto rendimento das prostitutas?

Uma explicação é o risco da ocupação, que afinal é ilegal. Só que, na Alemanha hoje, ou em França no século XV, a prostituição é legal e as prostitutas continuam a ser bem pagas. Para além disso, os carteiristas enfrentam um risco maior de serem presos e têm rendimentos modestos.

Talvez o risco seja antes estar exposto a doenças ou violência. Mas, mais arriscado ainda é ir para a guerra, e os soldados em missão só recebem umas 2 ou 3 vezes mais do que os soldados de caserna. As prostitutas ganham acima de 10 vezes mais à hora do que as mulheres-a-dias.

Por fim, talvez as prostitutas tenham de ser compensadas por terem uma carreira curta. Só que nada as impede de, quando envelhecerem, se mudarem para o mercado das limpezas onde podem continuar a trabalhar.

Recentemente, as economistas Edlund e Korn avançaram uma nova explicação para o ‘puzzle’ das prostitutas. Eles notam que é difícil uma prostituta arranjar um marido. É óbvio porque é que os homens preferem mulheres sexualmente fiéis para assegurar a paternidade dos filhos, mas é menos claro porque é que os homens são tão avessos a casarem-se com ex-prostitutas. O facto, no entanto, é que o são. Por isso, uma mulher que se prostitui prescinde da felicidade que um casamento lhe pode trazer, assim como do acesso aos potenciais rendimentos do marido. Logo, poucas mulheres o querem fazer, limitando a oferta e subindo a compensação por prescindir do casamento.

A favor desta explicação, Edlund e Korn notam que as imigrantes recebem menos na prostituição do que as nacionais. Estas mulheres podem voltar para o seu país e esconder o seu passado, tendo por isso melhores hipóteses de casar, pelo que exigem uma compensação menor.

Sem comentários: